segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

MULHERES DE MODIGLIANI

Amo todas as mulheres de Modigliani / as mulheres pintadas pelo artista sublime / e assaz apaixonado por mulheres / e formas evocativas do eterno feminino / Cada uma tem seu charme / seu doce encanto e abandono / nos detalhes dos braços cruzados / ou no vestido onde assoma a nudez da solidão / ( todo ser humano é um solitário / desde os primeiros aos últimos passos / deixa o rastro do eremita / perdido na vasta terra / Todavia não sabe disso / não aceita esse fato de um rosário doloroso / essa pecha de anacoreta / esse ermitão ou ermitoa / que o aflige do berço à cova ) / griebel-gribel /
Quão belas as mulheres pintadas por Modigliani!/ Belas e sozinhas / sentadas num espaço e num tempo / que as isolam em casulo / de onde não se sai para voar borboleta / na leveza das asas / Os olhos sem órbitas / olhar perdidos pelo azul voador / que não fogem para cima ou para baixo / mas se concentram num vago horizonte / afogados em cor e dor de solidão /
Mesmo quando não são pincelados em amarelo / há naqueles olhos um estar só no mundo / um quê de monja na cela úmida do corpo / mesmo sendo a Terra tão extensa / com mar e florestas e montanhas / onde pululam animais e insetos / e todas as cores para o olhar das flores / que miram ao longe os enamorados / perdidos de si no ensimesmamento do idílio / buscando o Deus de verdade / um ser para ter fé e esperança / mas somente encontra religiões burlescas / monges do teatro do absurdo /
As mulheres de Modigliani são belas / respiram o belo da idéia em Platão / porque na beleza pintada nelas / nas formas e cores únicas do pintor / e na atmosfera que se respira nelas / pode-se perceber a eternidade sobrepujando o tempo / a eternidade capturada e parada naquelas obras / de beleza inefável / a beleza queda na tela / congelada viva e feliz para sempre / ainda depois que o sol se apagar em carvão / ficando somente o grafite do artista / em cores e formas impregnadas na mente / e nos museus da natureza / que jamais olvidará ou desdenhará tamanha beleza / de longos pescoços / e vestidos em simplicidade e suaves nuançes / em cores e matizes ao tom do clarinete da violeta / também em peregrinação pela tez /
A única mulher de Modigliani / que conheci fora das obras do mestre / porquanto da qual ele só esboçou a idéia / era uma menina parda / que nem moça era ainda / mas apenas uma meiga e adorada criança / que se perdeu no mármore do passado / emparedada na pedra alvacenta : minha filha ! / enredada pelos fios de prata de Satã / que partiu a bilha / e suscitou a Constelação de ofioco / décimo terceiro signo do Zodíaco / que representa "Opiuchus" ou Serpentário / cintilante nas mentes de astrólogos e ocultistas / no universo onírico dos alquimistas / aprisionados pela Quimera da Pedra Filosofal /
Para minha filha ser eterna na expressão da beleza / colei sua imagem de inocente menina / num imaginário quadro de Modigliani / pois tão-somente assim ela será preservada / no eterno momento da criação artística / fixada viva através da magia do artista / sempre viva como a fluorescência / a sempre-viva flor em flor / na minha alma morta / Griebel-gribel / grib
Mesmo que a vida tenha eclodido diabos / e nos separado com a longa espada / que cortou o meu coração / retirado ainda vivo da caixa torácica / ela sempre estará comigo / na solidão da beleza da arte / longe do mundo cruel dos animais humanos / no interstício de uma obra-prima / que olha sob a leveza do chapéu / e une o fluxo do nosso olhar / na intercessão de uma mulher pintada por Modigliani / ( Aquela jovem amante de poeta / no livro e filme "A Insustentável Beleza do Ser " / esconde um Modigliani em seu chapeleiro / em suas tocas de chapéu ao espelho / antes e depois do amor / que não sustenta vivo o ser / o insustentável ser-para-a-morte de Martin Heidegger /
um martim-pescador da filosofia ) /
Porque Modigliani pintou para unir olhares no tempo / no transcurso da vida e na eternidade / assim como se enlaçam as mãos / e se molha de tinta o quadro / de aljôfar os primeiros passos da alva / e de lágrimas os olhos / que se tocam pelos fiapos de alma / que restaram de uma vida /
Nós seres humanos somos a escatologia da natureza / por isso prescindimos de artistas / belas poesias e rapsódias / do canto bíblico e do Alcorão / no canto arabesco / para que não sintamos que somos fezes /
Basta olhar a entrada teatral / dos indivíduos humanos na Igreja / ou qualquer outra instituição / que percebemos uma grotesca comédia / a hipocrisia cômica e trágica dos atores / a hipocrisia em ato /no andar no falar no cumprimentar / em todos os gestos e funções / na hierarquia animal / que escrevem nos códigos civis / os papéis e o "papelão" canhestro a representar / que faz espocar uma gargalhada cruel de demônio/ ante tantas fezes / que se repetem ao copiar atos e condutas / obras de arte e atitudes / daqueles que subiram ao céu / pela escada visualizada por Jacó /
Daí a necessidade premente de Modigliani / de alçar suas mulheres além do anil do céu / sem projetos e projéteis de foguetes Saturnos para sair da Terra / ou naves para explorar Marte / ou as luas Ganimedes Fobos Titã / É o modo Modigliani de sair / de fugir para longe / de tanta mediocridade animal /
Até uma criancinha de tranças inocentes / pode trair os próprios pais / e se unir ao inimigos / para delatar sua mãe pai e irmão / por um singelo doce que lhe coloquem boca /
Como somos assim tão pequenos / desde pimpolhos / voamos com os poetas / tocamos o céu na asa do avião / fingimos ser pombas da paz / espargindo a paz do vôo / sobre o olhar verde e azul / que Modigliani pintou / em mulheres que foram ao sublime / porque não podiam ser reais /

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